Seus olhos eram cinzentos, de um cinza grafite, eu bem me lembro.
Eram doces em sua tristeza, esperando uma resposta da qual nem a vida esteve pronta para lhe dar.
Pude alinhar meus olhos aos dela na praia, delante o mar.
Num dia primeiro, me lembro. Lembro de tê-la visto e pensar que realmente o primeiro dia de um mês possa ser uma oportunidade de renovação.
Mais ainda que uma renovação, ela foi uma transformação na minha vida.
Sentei-me ao seu lado, perguntando o que ela tanto procurava no vai e vem das ondas.
"Muito simples."- ela me disse.
"Procuro o segredo."
Obviamente, questionei de qual segredo ela se tratava.
"O segredo da vida. " - ela olhou-me então como se fosse óbvio o que acabara de dizer.
Então seu olhar veio a mim como uma resposta a todos os meus questionamentos internos, e pude entender o tal segredo que estava a procurar. Ela era uma daquelas pessoas santas que não se deixam iludir pelos valores materiais. Procurava uma razão para viver entre os mortais imperfeitos, com quem seu caráter casto não a permitia moralmente conviver.
Permaneci ao seu lado, compartilhando sua busca.
E assim o fiz durante todas as manhãs em que voltou para a praia.
Trinta dias contínuos. Nenhuma palavra. Apenas o som da água batendo nas pedras.
No trigésimo primeiro dia, ousei perguntar-lhe:
"Encontrou o segredo?"
"Não" - ela disse - " descobri que certos segredos não precisam ser desvendados."
" E agora, o que fazer?" - estive incrédulo com sua súbita desistência pela busca.
" Com essa jornada, descobri que a felicidade não está desvendar o segredo da vida. Certas vezes, é preciso apenas... olhar para o lado." - e então, olhou pra mim.
"Poderei eu dar-te felicidade?"
"Você é, naturalmente, minha felicidade. Fez-se fiel a mim, jamais duvidou da minha busca, ou mesmo da minha sanidade. Você é o que estive procurando. "
.. Anos depois, ainda me recordo daquela manhã na praia.
E certamente devo lembrá-la para sempre, pois foi neste dia em que realmente nasci.
Diriam outros que nosso relacionamento estaria fadado ao fracasso, pois sequer nos conhecíamos, por jamais termos dialogado. Mais com a minha anja dos olhos cinzentos, aprendi que o amor constrói-se nos alicerces do silêncio da compreensão.
Maria Luiza Girão Ferreira
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